Entrevista com Clemens Wijers, o Ardek do Carach Angren
O músico holandês compartilha detalhes exclusivos sobre o novo trabalho de sua banda e de como foi trabalhar com Till Lindemann, do Rammstein.
O tecladista holandês Clemens Wijers é a pedra angular das paisagens sonoras sombrias e teatrais da banda de black metal sinfônico Carach Angren, sob o nome artístico Ardek. Notório por seus arranjos orquestrais complexos, Wijers mistura a sofisticação dos elementos da música clássica com a ferocidade do metal em sua banda, colaborações e projetos solo.
Nesta entrevista exclusiva, originalmente publicada em inglês no site Integraudio.com, conversamos sobre seu equipamento atual, o aguardado novo álbum do Carach Angren – atualmente em produção, quatro anos após o lançamento de Franckensteina Strataemontanus – e seus projetos de metal industrial.
Wijers também compartilha suas experiências em colaborações com lendas do metal como Till Lindemann (Rammstein) e Peter Tägtgren (Pain, Hypocrisy), e nos dá uma ideia das ferramentas, técnicas e inspirações que moldam sua sonoridade. Boa leitura!
Sobre o Carach Angren
Karen Batista: Como tecladista do Carach Angren, qual é o teu equipamento atual para shows?
Clemens "Ardek" Wijers: Atualmente, uso um teclado MIDI conectado a um laptop com todas as minhas bibliotecas de música. Faço isso há mais de vinte anos e funciona muito bem. Às vezes, também levo um piano digital, mas depende do setlist.
Karen Batista: Nós, fãs do Carach Angren, estamos ansiosos desde que vocês anunciaram um novo álbum em produção. Qual será o conceito desse trabalho? Podes nos contar algo sobre ele?
Clemens Wijers: Sim, também estamos muito empolgados. O que posso adiantar é que será um EP! Mal posso esperar para finalizá-lo e lançá-lo. Nós nos programamos para gravar os vocais em novembro deste ano, e esperamos que tudo esteja finalizado até o final de 2024.
Infelizmente, ainda não posso revelar a história, pois seria um spoiler, mas posso dizer que retornamos a um dos nossos álbuns anteriores de uma nova maneira.
Projeto solo
Karen Batista: Teu projeto solo tem uma pegada de metal industrial diferenciada, aliada aos teus arranjos orquestrais característicos. Quais equipamentos ou programas utilizas que são diferentes dos que usas com o Carach Angren?
Clemens Wijers: Essa é uma boa pergunta. Sempre quis me distanciar um pouco do Carach nos meus projetos solo para não misturar as coisas. Meu trabalho solo sempre foi tipo uma cozinha experimental onde posso fazer o que quiser.
Com Parasite Twin, por exemplo, fiz experimentos com sons industriais. Desenvolvi vários sons com um sintetizador analógico, mas também gravando minha própria voz, distorcendo-a e recortando-a.
Muitos desses sons também entraram nas composições de Franckensteina [Strataemontanus]. Originalmente, até tinha reservado a faixa Franckensteina… para o meu álbum industrial, mas ela acabou entrando no álbum do Carach. [Risos]
Assim sendo, no geral, muitos dos equipamentos são os mesmos, mas com o Carach há um caminho mais definido de como fazemos as coisas. Por isso, sempre tomo cuidado para não exagerar. Sob meu nome, posso lançar uma faixa clássica amanhã e uma faixa de terror ambiente na próxima semana, sem muitos limites.
Um equipamento de que virei fanzaço é o Volca Keys, da KORG. Basicamente, é um sintetizador totalmente analógico que permite criar sons do zero. Conheci-o através de um dos meus melhores amigos, o Jesper, que tem um canal no YouTube sobre sintetizadores analógicos, especialmente o Eurorack.
Karen Batista: Ainda sobre o teu projeto solo, tens tocado uma nova faixa ao vivo ultimamente, chamada Blind Confirmed. Vais lançá-la oficialmente como um single em breve, ou será que podemos esperar um álbum novo?
Clemens "Ardek" Wijers: A minha ideia é lançar um novo EP com material industrial/eletrônico, [mas] vai demorar um pouco.
O problema é que tenho a sorte de trabalhar para outros artistas. Quando tenho ideias para músicas, geralmente as envio para alguns contatos, e se eles curtirem, elas podem acabar nos projetos ou álbuns deles.
Sou um pouco caótico nesse sentido — às vezes começo a fazer um álbum novo para mim, mas, no processo, penso em alguém que pode querer uma ou outra faixa, e isso acontece com frequência.
Parcerias de alto calibre
Karen Batista: Tu tiveste o privilégio de trabalhar com lendas do metal, como Till Lindemann, do Rammstein, e Peter Tägtgren, do Hypocrisy e Pain, no projeto LINDEMANN. Como isso aconteceu e como foi colaborar com eles?
Clemens Wijers: Em 2014, o Peter estava mixando nosso álbum This is No Fairy Tale e casualmente me perguntou onde gravamos a orquestra. Eu disse que fiz tudo sozinho em casa :)
Ele comentou que talvez precisasse da minha ajuda em um projeto que, claro, era segredo na época. Lembro que ele enviou as músicas, e eu pude mandar ver nos arranjos orquestrais. Foi incrível trabalhar nos álbuns deles.
Também compus algumas músicas como That's My Heart, Wer Weiss Das Schon e uma faixa chamada Sauber.
Para That's My Heart, o Till veio gravar os vocais na minha casa na época, o que foi muito legal.
Ano passado, o álbum de Till, Zunge, foi lançado, e nele há outra música que compus, chamada Alles für die Kinder.
É sempre maravilhoso trabalhar com ele, verdadeiramente criativo e estimulante.
Karen Batista: Também trabalhaste com o Joe Lynn Turner, conhecido pelo trabalho dele com Rainbow, Yngwie Malmsteen e Deep Purple, no álbum Belly of the Beast. Como foi essa experiência?
Clemens Wijers: Na verdade, isso foi com o Peter [Tägtgren], porque ele compôs todo o álbum para ele. O Peter me pediu para ajudar nos arranjos de duas músicas. [Nota da autora: “Tortured Soul” e “Dark Knight”]. As músicas e, claro, os vocais do Joe Lynn eram espetaculares. O Peter é um cara muito gente fina. Nós também fizemos turnê juntos nos últimos anos, e é sempre um prazer trabalhar com ele!
Trilhas sonoras e trabalho em estúdio
Karen Batista: Tu também compões trilhas sonoras. Quais ferramentas ou plugins específicos consideras particularmente úteis para um som digno de cinema?
Clemens Wijers: Gosto de encontrar um equilíbrio entre realismo e liberdade para fazer o que quero em uma trilha sonora. Às vezes, gravo instrumentos reais, como cordas. Trabalho há muito tempo com um bom amigo chamado Nikos Mavridis, um violinista incrivelmente talentoso da Grécia. Adicionar um músico de verdade eleva uma trilha a um patamar totalmente novo.
Outro "truque" – se é que posso chamar assim – é que muitas vezes deixo alguns sons "mono" na mixagem para que eles apareçam mais claramente. Isso também adiciona um certo realismo. Muitos produtores misturam camadas e camadas de samples e sons, o que pode soar artificial rapidamente. Gosto de ser detalhista nos reverbs e delays.
O mais importante para mim é o sistema de áudio em que trabalho. Invisto bastante nisso ao longo dos anos para alcançar uma sensação de realismo. Isso realmente ajuda na composição e na mixagem. Eu me considero melhor compositor do que mixador, então, sempre que o orçamento permite, gosto de contratar alguém para mixar :)
[Nota da autora: segundo entrevista anterior com o canal The Modular Clubhouse, os VSTs preferidos de Wijers incluem os samples orquestrais hollywoodianos da EastWest Sounds; quanto a sintetizadores, ele obtém seus sons sinistros com o Zebra 2, da U-He.]
Karen Batista: Que software ou hardware básico tu recomendas para aspirantes a compositores interessados na fusão entre o metal e o orquestral?
Clemens Wijers: Eu uso o Cubase, então costumo recomendá-lo para as pessoas. Trabalho com ele há mais de 20 anos, e [os desenvolvedores] também me ajudaram algumas vezes com novas atualizações, portanto, sinto que devo mencionar isso aqui :) O Cubase é ótimo para integrar plugins e editar MIDI, mas também para gravar áudio em geral.
Quanto às bibliotecas de samples, hoje em dia há tantas opções disponíveis. Literalmente recebo a mesma pergunta a cada poucas semanas: "Qual biblioteca você usa?". Muitos pensam que é só comprar a biblioteca X ou Y, que sua música vai melhorar. Na minha opinião, isso não é verdade. É preciso trabalhar nos fundamentos. Por exemplo, você tem que saber o que é spiccato ou pizzicato. Ou entender de que forma alguns samples foram gravados e por que soam como gravações próximas ou distantes, e por aí vai.
Meu conselho é encontrar algo com o qual você se conecte emocionalmente. As pessoas tendem a esquecer que todas essas bibliotecas são, na verdade, criadas a partir de mini-performances dos melhores músicos, mesmo que eles tenham tocado a mesma nota repetidamente para o software funcionar da maneira que funciona.
É melhor realmente conhecer uma ou duas bibliotecas a nível de especialista e ouvir atentamente o que está acontecendo no software e como usá-lo. Basta experimentar. Existem algumas bibliotecas ótimas disponíveis gratuitamente, mesmo hoje em dia.
Karen Batista: Tens te empolgado recentemente com algum instrumento, efeito, ferramenta de produção, etc. no teu arsenal musical?
Clemens Wijers: Sim, eu mencionaria novamente o Volca Keys, da KORG. Não é um instrumento recente, mas no meu setup, é relativamente novo. Adoro simplesmente ajustar e extrair novos sons dele. É um alento em relação a todas as coisas geradas por computador, para ser sincero. Hoje em dia, também costumo apenas gravar sons, como percussão ou coisas estranhas. Às vezes, posto trechos nas redes sociais.
Eu tenho um monte de samples ótimos no meu computador, mas sempre sinto a necessidade de tornar as coisas mais autênticas. Especialmente nesta era da IA! Não há outra forma de nós, artistas, sobrevivermos. Ultimamente, tomei consciência desse fato. Não podemos mais recorrer a atalhos porque a IA é basicamente a rainha dos atalhos. Então, sim, estou tentando gravar novos sons o tempo todo e espero que isso traga um diferencial à minha música.
Composição e inspirações
Karen Batista: Alguns artistas sentem que a inspiração vem espontaneamente até eles, outros sentem que a inspiração vem enquanto estão trabalhando. Como é para ti? Qual é tua abordagem ao compôr?
Clemens Wijers: Depende do trabalho. Quando estou trabalhando em um curta-metragem, muitas vezes conheço a história através do diretor e tenho as imagens em movimento diante de mim. Gosto disso porque me dá ideias imediatamente. Muitas vezes começo a tocar piano enquanto olho para uma cena e sigo a partir daí.
Com o Carach, é uma coisa totalmente diferente. Posso estar no carro e um riff surge na minha mente. Posso gravá-lo de forma rudimentar vocalizando algo rapidamente no meu celular, e trabalhar nele mais tarde. Também com o Carach, a história dita o que está acontecendo. Às vezes leio um livro ou escrevo uma parte de uma história primeiro e continuo a partir daí.
Preciso dizer que sempre sonhei em compor em tempo integral, mas existe um paradoxo porque também é preciso um tempo longe para se inspirar. Descobri isso assim que cheguei ao estágio de conseguir compor em tempo integral. Não é assim que funciona. Se tudo o que você vê o dia todo é seu teclado MIDI e a tela do computador, a inspiração não vem. Então, às vezes, as melhores ideias vêm até mim depois de uma turnê ou algo assim. É complicado!
Karen Batista: Quais são as tuas principais influências como músico e compositor? Quais músicos, bandas, álbuns, mídias etc. te inspiraram e ainda te inspiram?
Clemens Wijers: Quanto ao piano, sou influenciado por Glenn Gould. Ele foi o melhor pianista que já existiu, na minha opinião. Visitei o túmulo dele no ano passado e, para mim, foi uma experiência especial. Ainda assisto algumas de suas performances de Bach, às vezes diariamente.
Muitos compositores de trilhas sonoras me influenciaram, especialmente John Williams. Lembro de assistir "Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros" pela primeira vez. Muito do filme existe por causa da trilha sonora fantástica. John Williams é menos conhecido por algumas de suas músicas mais sombrias, como em "Guerra dos Mundos". Adoro o que ele fez nesse filme. Estudei muito essa trilha sonora e aprendi várias técnicas com ela.
Trent Reznor também foi uma grande inspiração para mim. Eu costumava ouvir a trilha que ele fez para o jogo "Quake". Ela não foi feita para ser ouvida sem o jogo, mas eu vivia com ela no Walkman. [Risos] A música dele parece vir de uma solidão profunda. Há algo muito sombrio e sinistro no trabalho dele que sempre me influencia. Isso se reflete até mesmo em sua trilha sonora de "A Rede Social". É um material fenomenal.
Karen Batista: Se tu pudesse dar um conselho para ti mesmo quando mais jovem, ou para qualquer músico aspirante buscando um caminho semelhante, qual seria? Seja relacionado à mentalidade e/ou um conselho técnico — o tipo de coisa que tu gostarias de ter sabido antes.
Clemens Wijers: Não tenha pressa. Faça as coisas um passo de cada vez. Há uma tendência em todos nós, especialmente músicos e artistas, de querer atingir o sucesso, ou de nos compararmos constantemente aos outros. Em retrospectiva, diria a mim mesmo mais jovem para simplesmente relaxar e confiar no caminho que está seguindo.
Além disso, lembro-me de que, quando era mais novo, tinha menos recursos e vivia reclamando disso, mas hoje em dia percebo que também foi uma bênção. Atualmente, vivemos em uma época com acesso a tudo e a qualquer momento, e isso muitas vezes, para mim, atrapalha a criatividade. Às vezes, sinto saudade da época em que não tínhamos celulares o tempo todo. Não havia mais nada a fazer a não ser tocar um instrumento, por exemplo.
Meus agradecimentos ao Clemens pela solicitude em conceder esta entrevista. Dank je wel, Clemens!
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Além disso, agradecimentos ao Richard Orwell pelos vídeos legendados e traduzidos. Muito obrigada, Richard!